sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Escolha melhor as suas batalhas. [Sobrevivência não é uma competição.]



Recentemente eu ando pensando muito na loucura, aquela de verdade mesmo, que impõe o caos da nossa mente e nos faz ser diferente do que somos ou gostaríamos de ser. Lembro da minha bisa espanhola com 91 anos e um sotaque forte assim como a família que esta mulher criou. Meu avô hoje está se esquecendo aos poucos de coisas importantes, as vezes se esquece de coisas pequenas... aos poucos, todos nós que tentamos a cada dia, não matar nossa esperança de um dia melhor, acabamos cansados demais e começamos a acostumar ser outra pessoa, estamos esquecendo de nós e isso vem com a idade.
Somos pessoas diferentes e tudo o que falamos ou sentimos está ligado a algo, a natureza caótica e inerente a realidade nos faz pensar que quando estamos sozinhos estamos seguros e por isso talvez tanta gente resolveu falar de coisas tão importantes sem parar pra pensar tanto nessas coisas. Pisamos na terra mas não a sentimos. Temos feito isso com nosso eu interno. Eu quando ando pela rua finjo ser quem eu sou quando estou sozinho tomando meu banho. Todas essas personalidades que criamos quando estamos sozinhos, todos esses eus dentro das nossas cabeças são partes importantes da nossa personalidade que tentamos extinguir aos poucos para nos sentirmos mais pertencentes a esse mundo de merda que todo mundo reclama.

Filósofos antigos deram a resposta. Devemos nos tornar quem somos porque um dia inevitavelmente deixaremos de ser. Nem precisamos morrer pra isso, aos vinte e poucos já tem gente cansada demais. Nas diferenças entre todos nós, eu me pego pensando por exemplo que homens e mulheres tomam banho de um jeito diferente, a agua escorre diferente pelos corpos despadronizados e parece algo banal eu pensar no movimento de cabeça de outras pessoas durante o banho, mas nossa sociedade já decidiu banalizar o próprio mal de uma forma que me incomoda, a ponto de pensar que poucos homens que eu conheço lavam o próprio cu com a mesma energia que limpam o umbigo por um medo babaca de se tocar em alguns pontos do próprio eu.

Minha bisa aos 91 anos já não lembrava direito onde morava e meu vô hoje não tem certeza se já conheceu todos os netos, eu... Eu que já não sou hoje o homem que era ontem, no mesmo dia me olho no espelho e me sinto mulher, horas o sexo frágil, horas um mulherão da porra. Num geral, eu estou fingindo o tempo todo que o mundo não é tão ruim, que não tem geladeiras cheias de água apenas, que a pessoa me olhando estranho com meu batom vermelho e barba laranja na esquina de casa talvez não entenda muito sobre fluidez de gênero ou outras coisas assim, mas mesmo assim essa pessoa queira mudar o mundo pra melhor e para todos. Talvez ele não pense na banalização do mal, talvez ele não tenha alguém que ama muito deixando de ser quem é dia a dia, talvez ele só não perceba isso, talvez ele não esteja bem pra pensar nisso hoje. Tudo bem, cada um leva seu tempo e luta suas lutas internas. Que um dia a gente consiga conversar de verdade e tentar entender melhor as pessoas. Afinal, não é possível que só as vozes na minha cabeça concordem comigo. Enquanto eu continuo andando pela rua com meu batom vermelho e minha barba laranja, na tentativa ingênua de reafirmar ou demonstrar o que sou. Eu sigo deixando de ser e tentando lembrar quem eu sou. 

Escolha melhor as suas batalhas, sobrevivência não é uma competição.

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